O missionário evangélico Ricardo Lopes Dias foi exonerado do cargo de coordenador-geral de Índios Isolados e de Recente Contato da Fundação Nacional do Índio (Funai). A decisão foi publicada no Diário Oficial da União na quarta-feira (25).
No mesmo dia, Marcelo Fernando Batista Torres, servidor público de carreira da instituição, foi nomeado para assumir a pasta. A portaria de nomeação foi assinada pelo secretário-executivo do Ministério da Justiça e Segurança Pública, Tercio Tokano.
Ricardo tinha sido nomeado para o cargo em fevereiro. Ele é formado em teologia e atuou por anos na Missão Novas Tribos do Brasil (MNTB), organização que tem por objetivo a evangelização de indígenas, o que gerou desconforto dentro do órgão.
Processos na Justiça aos quais a MNTB responde informam, por exemplo, que o instituto “camufla” seus objetivos religiosos nas aldeias com ações de assistência.
Histórico
O cargo que era ocupado por Ricardo é considerado o mais técnico do órgão e estava regido pelas Funções Comissionadas do Poder Executivo (FCPE), o que obrigava a administração da Funai a determinar um servidor público concursado para o posto. No entanto, o presidente da fundação, Marcelo Augusto Xavier, abriu uma brecha para que o cargo pudesse ser ocupado por pessoas de fora dos quadros da administração pública. A decisão ocorreu em janeiro. O despacho assim determinou:
“O presidente da Funai […] no uso das atribuições […] resolve permutar a Função Comissionada do Poder Executivo de Coordenador-Geral de Índios Isolados e de Recente Contato, código FCPE 101.4, pelo Cargo em Comissão de Coordenador-Geral de Orçamento, Contabilidade e Finanças, código DAS 101.4”, dizia o texto publicado no DOU.
Nomeação foi questionada na justiça
No início de fevereiro, o Ministério Público Federal havia pedido à Justiça a suspensão da nomeação de Dias, alegando que havia risco de tentativa de contato com os índios isolados. No entanto, uma decisão da juíza federal Ivani Silva da Luz, da 6ª Vara do Distrito Federal, decidiu manter a nomeação do antropólogo e missionário.
Em maio, em mais um capítulo do imbróglio jurídico acerca da nomeação de coordenador, o desembargador Antônio Souza Prudente, do Tribunal Regional Federal da Primeira Região acolheu liminarmente o pedido do MP e suspendeu a nomeação de Ricardo. O desembargador também anulou a mudança no regimento interno da Funai, que liberava a nomeação de pessoas de fora do quadro da fundação para a chefia da coordenação de índios isolados.
Já no início de junho, o ministro João Otávio de Noronha, presidente do Superior Tribunal de Justiça (STJ), suspendeu a decisão do desembargador e permitiu a volta de Ricardo ao cargo. Na época, o ministro considerou que ele preenchia os requisitos legais para permanecer no cargo e que a ligação dele com uma organização de evangelização de índios não permitia concluir conflito de interesses.
“Trata-se de ilação sem base, conjectura que fere, no caso, a presunção de legitimidade dos atos do Executivo e caracteriza intervenção do Judiciário na administração interna de outro poder sem fato concreto sério e comprovado”, decidiu.
Para o membro do Conselho Indigenista Missionário (Cimi), Francisco Loebens, a nomeação de Ricardo faz parte de uma política de integracionista do governo em relação aos povos indígenas.
“Essa política do governo em relação aos povos indígenas é integracionista. E a gente vê isso no sentido da diminuição e da não demarcação dos territórios e nessa visão de que os povos indígenas não são sujeitos, mas categorias transitórias, e por isso não precisam de terras, de espaços. E o fundamentalismo religiosos com essa perspectiva da conquista espiritual se adequa a essa política”, explicou.
G1*